Decreto Lei n.º 156/78, de 30 de junho – ” Regime de Recrutamento e Funções dos Juízes Sociais”
Estabelece normas para o regime de recrutamento e funções dos juízes sociais.
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- A Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais prevê a intervenção de juízes sociais nas causas que tenham por objecto questões de arrendamento rural e em certas categorias de acções da competência dos tribunais do trabalho e dos tribunais de menores.
Entrando a referida lei em vigor no próximo dia 31 de Julho, e tendo o Governo sido incumbido de a regulamentar, torna-se necessário organizar o regime de recrutamento e funções dos juízes sociais.
É este o objectivo do presente diploma. - Fundado na previsão constitucional que admitiu a institucionalização de formas de participação popular na administração da justiça, o legislador ordinário consagrou o sistema apenas nos casos acima referidos, o que traduz uma atitude de prudência mas também de realismo, sabido como é estar-se perante instituição que só lentamente digere alterações nas suas estruturas tradicionais.
Serve a explicação para justificar que se não tenha ido mais longe num sector em que não seríamos evidentemente pioneiros, pois tem tido abundantes aplicações em largo número de países de idênticas raízes culturais e políticas. - Com a institucionalização dos juízes sociais procura-se fundamentalmente trazer a opinião pública até aos tribunais e levar os tribunais até à opinião pública: já actuando contra a rotina dos juízes e sensibilizando-os em relação aos valores sociais dominantes e suas prioridades, já estimulando os cidadãos à formação de opiniões correctas a respeito da administração da justiça e ao reforço do seu sentimento de legalidade.
Estes objectivos estiveram presentes na definição do regime de recrutamento e funções dos juízes sociais.
Tentou-se encontrar o justo ponto de equilíbrio entre três ordens de necessidades: a de garantir um acesso democrático das organizações de classe às formas de designação dos juízes sociais, a de proteger as minorias, a de deixar ao Governo um mínimo de intervenção tutelar e supletiva.
Sem descer a excessos, o diploma não deixa de possuir o sentido regulamentarista que lhe é próprio e que se justifica também pelas características do nosso movimento associativo, em bastantes casos com experiência organizativa de muito recente data.
Nestes termos:
O Governo decreta, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
CAPÍTULO ÚNICO
SECÇÃO I
Disposições comuns e gerais
Artigo 1.º
(Capacidade para ser nomeado juiz social)
Podem ser nomeados juízes sociais cidadãos portugueses de reconhecida idoneidade que satisfaçam as seguintes condições:
a) Ter mais de 25 e menos de 65 anos de idade;
b) Saber ler e escrever português;
c) Estar no pleno gozo dos direitos civis e políticos;
d) Não estar pronunciado nem ter sofrido condenação por crime doloso.
Artigo 2.º
(Dispensa do cargo)
Não podem ser nomeados juízes sociais:
a) O Presidente da República;
b) Os membros do Conselho da Revolução;
c) Os membros da Assembleia da República e das assembleias regionais;
d) Os membros do Governo Central e dos governos regionais;
e) Os magistrados judiciais e do Ministério Público;
f) Os ministros de qualquer religião;
g) Os que padeçam de doença ou anomalia que impossibilite o exercício do cargo.
Artigo 3.º
(Escusa do cargo)
1 – Podem requerer escusa do cargo de juiz social:
a) Os militares no activo;
b) Os que padeçam de doença ou anomalia que dificulte o exercício do cargo;
c) Os que apresentem razão considerada justificativa, desde que não susceptível de compensação pecuniária.
2 – O pedido de escusa é dirigido ao Ministro da Justiça.
Artigo 4.º
(Natureza do cargo)
O exercício do cargo de juiz social constitui serviço público obrigatório e é considerado, para todos os efeitos, como prestado na profissão, actividade ou cargo do respectivo titular.
Artigo 5.º
(Duração das funções)
1 – A nomeação dos juízes sociais faz-se por períodos de dois anos, com início em 1 de Outubro.
2 – Os juízes sociais cessantes mantêm-se em exercício até à tomada de posse dos que os devam substituir.
Artigo 6.º
(Posse)
Os juízes sociais tomam posse:
a) Nos tribunais instalados em comarcas sede de distrito judicial, perante o presidente do Tribunal de Relação;
b) Nos demais tribunais, perante o respectivo presidente.
Artigo 7.º
(Substituições)
1 – Os juízes sociais são substituídos, nas suas faltas e impedimentos, por suplentes.
2 – Aos juízes sociais suplentes aplicam-se, quando em exercício, as normas relativas aos efectivos.
Artigo 8.º
(Impedimentos e suspeições)
1 – Não podem intervir como juízes sociais, em determinada causa, as pessoas em relação às quais se verifiquem as causas de impedimento ou os motivos de suspeição a que estão sujeitos os juízes de direito.
2 – As suspeições são deduzidas até cinco dias antes da data designada para o julgamento e decididas, sem recurso, pelo juiz do processo.
3 – Aos impedimentos e suspeições são aplicáveis, com as devidas adaptações, as regras de processo sobre garantias de imparcialidade.
Artigo 9.º
(Remunerações)
1 – Os juízes sociais têm direito a ajudas de custo bem como a ser indemnizados pelas despesas de transportes e perdas de remuneração que resultem das suas funções.
2 – O montante das ajudas de custo é fixado por despacho do Ministro da Justiça.
3 – Os encargos previstos nos números anteriores serão suportados pelo Cofre Geral dos Tribunais.
Artigo 10.º
(Disciplina)
São aplicáveis aos juízes sociais, com as necessárias adaptações, as normas sobre disciplina estabelecidas para os juízes de direito.
SECÇÃO II
Tribunais do trabalho
Artigo 11.º
(Recrutamento)
Os juízes sociais que hão-de intervir nas causas da competência dos tribunais do trabalho são nomeados de entre cidadãos que possuam a qualidade de entidade patronal, trabalhador assalariado ou trabalhador independente, e residam na área de jurisdição do respectivo tribunal, nos termos dos artigos seguintes.
Artigo 12.º
(Número de juízes)
O número de juízes sociais é o constante do mapa anexo.
Artigo 13.º
(Prazo para apresentação de candidaturas)
A nomeação é precedida da apresentação de candidaturas, a fazer durante o mês de Maio do ano em que se complete o biénio relativo à anterior designação.
Artigo 14.º
(Forma de designação de candidatos)
1 – Cada organização representativa de entidades patronais, de trabalhadores assalariados ou de trabalhadores independentes tem a faculdade de eleger, em assembleia geral, candidatos ao cargo de juiz social.
2 – As candidaturas podem ainda ser apresentadas por grupos com, pelo menos, cinquenta entidades patronais ou duzentos trabalhadores, residentes na área da comarca e não inscritos em qualquer organização de classe.
Artigo 15.º
(Número de candidatos)
1 – O número de candidatos não pode exceder, por comarca:
a) Organizações ou grupos com menos de 100 entidades patronais ou 1000 trabalhadores – 2;
b) Organizações ou grupos com 100 a 499 entidades patronais ou 1000 a 4999 trabalhadores – 4;
c) Organizações ou grupos com 500 a 999 entidades patronais ou 5000 a 9999 trabalhadores – 6;
d) Organizações ou grupos com pelo menos 1000 entidades patronais ou 10000 trabalhadores – 8.
2 – Exceptuam-se do disposto no número anterior as comarcas de Lisboa e Porto, em que o número de candidatos previsto nas diferentes alíneas é de 4, 8, 12 e 16.
Artigo 16.º
(Forma de apresentação das candidaturas)
1 – As candidaturas são apresentadas no Conselho Superior da Magistratura, separadamente para cada comarca, acompanhadas dos seguintes elementos:
a) Nome, data do nascimento, naturalidade, filiação, estado civil, profissão e residência dos candidatos;
b) Assinaturas, reconhecidas por notário, dos corpos gerentes das organizações ou dos subscritores das propostas;
c) Documento comprovativo das qualidades referidas no artigo 11.º;
d) Declaração de que o número de inscritos nas organizações ou de proponentes corresponde aos escalões estabelecidos no artigo 15.º;
e) No caso previsto no n.º 2 do artigo 14.º, declaração de que os proponentes não se encontram inscritos em organização de classe.
2 – A falsa indicação dos elementos referidos nas alíneas d) e e) do número anterior constitui crime de falsas declarações.
Artigo 17.º
(Sorteio)
1 – Quando o número de candidatos for superior ao triplo do número de juízes sociais estabelecido para cada comarca, o Conselho Superior da Magistratura, nos quinze dias seguintes ao termo do prazo fixado no artigo 13.º, procederá a sorteio.
2 – O sorteio faz-se por meio de cartões numerados, entrando numa urna os números correspondentes aos candidatos e noutra os correspondentes aos juízes sociais e tirando-se os cartões, um a um, alternadamente, de cada urna.
3 – Preside o vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura, coadjuvado pelos funcionários de secretaria que designar.
4 – Os resultados são registados em livro próprio à medida que forem sendo apurados.
Artigo 18.º
(Organização e remessa de listas)
1 – Nas quarenta e oito horas seguintes ao apuramento de resultados, o Conselho Superior da Magistratura organiza e remete ao Ministério da Justiça:
a) Uma lista tripla com os candidatos saídos do sorteio;
b) Uma lista de candidatos, nos casos em que não tenha tido lugar o sorteio;
c) Os documentos que acompanharam os processos de candidatura.
2 – No mesmo prazo, o Conselho faz expedir as listas para as respectivas comarcas.
Artigo 19.º
(Afixação das listas)
As listas são afixadas, pelo prazo de dez dias, nos tribunais das comarcas a que respeitem, com menção da faculdade de reclamação prevista no artigo seguinte.
Artigo 20.º
(Reclamação)
1 – Até ao quinto dia subsequente ao termo do prazo de afixação, pode qualquer pessoa deduzir reclamação fundada em violação de disposições do presente diploma.
2 – A reclamação é dirigida ao Ministro da Justiça.
Artigo 21.º
(Nomeação dos juízes sociais)
1 – Apreciadas as reclamações e verificados os requisitos estabelecidos para a nomeação, procede-se à designação dos juízes sociais, de entre os candidatos constantes das listas.
2 – A nomeação é feita por despacho conjunto do Ministro da Justiça e do Ministro do Trabalho, a publicar no Diário da República.
Artigo 22.º
(Nomeação oficiosa)
Na falta ou insuficiência de candidatos, a nomeação faz-se oficiosamente.
Artigo 23.º
(Regime de funções)
1 – As funções de juiz social são exercidas por períodos de quinze dias, em regime rotativo.
2 – Compete ao presidente do tribunal organizar a escala de juízes sociais para cada trimestre.
3 – Quando a jurisdição de um tribunal abranger mais de uma comarca incluem-se na escala, indiscriminadamente, os juízes sociais de qualquer das comarcas.
4 – A escala é afixada no tribunal e comunicada aos juízes sociais por carta registada.
SECÇÃO III
Arrendamento rural
Artigo 24.º
(Recrutamento)
Os juízes sociais que hão-de intervir em acções que tenham por objecto questões de arrendamento rural são nomeados de entre cidadãos que possuam a qualidade de senhorio ou rendeiro e residam na área da comarca, nos termos dos artigos seguintes.
Artigo 25.º
(Número de juízes)
O número de juízes sociais é o constante do mapa anexo.
Artigo 26.º
(Forma de designação de candidatos)
1 – Cada organização representativa de senhorios ou rendeiros tem a faculdade de eleger, em assembleia geral, candidatos ao cargo de juiz social.
2 – As candidaturas podem ainda ser apresentadas por grupos com, pelo menos, 20 senhorios ou 50 rendeiros, residentes na área da comarca e não inscritos em qualquer organização de classe.
Artigo 27.º
(Número de candidatos)
O número de candidatos não pode exceder, por comarca:
a) Organizações ou grupos com menos de 50 senhorios ou 100 rendeiros – 2;
b) Organizações ou grupos com 50 a 249 senhorios ou 100 a 499 rendeiros – 4;
c) Organizações ou grupos com 250 a 499 senhorios ou 500 a 999 rendeiros – 6;
d) Organizações ou grupos com, pelo menos, 500 senhorios ou 1000 rendeiros – 8.
Artigo 28.º
(Nomeação de juízes sociais)
Os juízes sociais são nomeados por despacho conjunto do Ministro da Justiça e do Ministro da Agricultura e Pescas, a publicar no Diário da República.
Artigo 29.º
(Regime de funções)
As funções de juiz social são exercidas por períodos do sessenta dias, em regime rotativo.
Artigo 30.º
(Disposições subsidiárias)
Aplicam-se a esta secção, com as devidas adaptações, as disposições constantes dos artigos 13.º, 16.º a 20.º, n.º 1 do artigo 21.º, 22.º e n.os 2, 3 e 4 do artigo 23.º
SECÇÃO IV
Tribunais de menores
Artigo 31.º
(Recrutamento)
Os juízes sociais que hão-de intervir nas causas da competência dos tribunais de menores são nomeados de entre cidadãos residentes na área do município da sede do respectivo tribunal, nos termos dos artigos seguintes.
Artigo 32.º
(Número de juízes)
O número de juízes sociais é o constante do mapa anexo.
Artigo 33.º
(Organização de candidaturas)
A organização de candidaturas compete à câmara municipal do município da sede de cada tribunal e tem início no mês de Abril do ano em que se complete o biénio relativo à anterior designação.
Artigo 34.º
(Preparação das listas)
Na preparação das listas, as câmaras municipais podem socorrer-se da cooperação de entidades, públicas ou privadas, ligadas por qualquer forma à assistência, formação e educação de menores, nomeadamente:
a) Associações de pais;
b) Estabelecimentos de ensino;
c) Associações profissionais relativas a sectores directamente implicados na assistência, educação e ensino;
d) Associações e clubes de jovens;
e) Instituições de protecção à infância e à juventude.
Artigo 35.º
(Elaboração das listas)
1 – As listas são organizadas por forma que contenham um número de candidatos igual ao triplo do número de juízes sociais estabelecido para cada tribunal.
2 – Sempre que possível, as listas incluirão igual número de candidatos de cada sexo.
Artigo 36.º
(Votação e remessa das listas)
As listas são votadas pela assembleia municipal e remetidas, durante o mês de Junho, ao Conselho Superior da Magistratura e ao Ministério da Justiça.
Artigo 37.º
(Nomeação de juízes sociais)
Os juízes sociais são nomeados por despacho do Ministro da Justiça, a publicar no Diário da República.
Artigo 38.º
(Disposições subsidiárias)
Aplicam-se a esta secção, com as devidas adaptações, as disposições constantes da alínea a) do n.º 1 do artigo 16.º, do n.º 2 do artigo 18.º, dos artigos 19.º e 20.º, do n.º 1 do artigo 21.º e dos artigos 22.º e 23.º
SECÇÃO V
Disposições finais e transitórias
Artigo 39.º
(Primeira nomeação de juízes sociais)
As candidaturas relativas à primeira designação de juízes sociais devem ser organizadas por forma a serem apresentadas no prazo de quarenta e cinco dias, contado da data da entrada em vigor do presente diploma.
Artigo 40.º
(Alterações na organização judiciária)
1 – Se, posteriormente à primeira nomeação de juízes sociais e antes de expirado o biénio de exercício dos cargos, houver alteração na organização judiciária por via de extinção ou criação de comarcas ou tribunais ou da modificação das respectivas áreas de jurisdição, observar-se-á o seguinte:
a) Os juízes sociais das comarcas ou tribunais extintos consideram-se providos nas comarcas ou tribunais que recebam a anterior jurisdição;
b) Sendo necessário designar juízes para novas comarcas ou tribunais, a nomeação recairá nos candidatos sobrantes das listas organizadas para a primeira nomeação; não sendo possível, proceder-se-á a nomeação oficiosa;
c) Os juízes sociais das comarcas ou tribunais cujas áreas de jurisdição sejam modificadas permanecem nos respectivos lugares ou consideram-se providos noutras comarcas ou tribunais, consoante residam ou não nas novas áreas.
2 – Se a alteração ocorrer posteriormente à data da entrada em vigor do presente diploma mas antes da primeira designação de juízes sociais, adoptar-se-á, com as necessárias adaptações, o procedimento estabelecido no número anterior.
3 – Os juízes sociais nomeados nos termos da alínea b) do n.º 1 exercem os cargos apenas até ao termo do biénio iniciado.
Artigo 41.º
(Entrada em vigor do diploma)
Este diploma entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. – Mário Soares – Jaime José Matos da Gama – José Dias dos Santos Pais – Luís Silvério Gonçalves Saias – António Manuel Maldonado Gonelha.
Promulgado em 21 de Junho de 1978.
Publique-se.
O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.
O Ministro da Justiça, José Dias dos Santos Pais.