Decreto-Lei n.º 71/2007 – Estatuto do gestor público
Aprova o novo estatuto do gestor público e revoga o Decreto-Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro
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Decreto-Lei n.º 71/2007
de 27 de Março
O estatuto do gestor público (EGP) foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro, que revogou o Decreto-Lei n.º 831/76, de 25 de Novembro, não tendo sido objecto, até hoje, de qualquer alteração.
Dadas as transformações entretanto ocorridas no sector empresarial do Estado (SEE), o contexto em que surgiu o EGP encontra-se hoje, todavia, substancialmente alterado.
Com efeito, após a 1.ª década de privatizações e de transformação de empresas públicas, o XIII Governo Constitucional iniciou a reforma do sector público empresarial, que veio a concretizar-se na Lei n.º 58/98, de 18 de Agosto – Lei das Empresas Municipais, Intermunicipais e Regionais -, e no Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, que aprova o regime do sector empresarial do Estado.
Do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, ficou a constar, no n.º 1 do artigo 15.º, que os administradores designados ou propostos pelo Estado teriam estatuto próprio, a definir por legislação especial. Todavia, de harmonia com o artigo 39.º do mesmo decreto-lei, até ser aprovada a legislação prevista no artigo 15.º, manteve-se em vigor o regime do EGP. Decorridos mais de seis anos, a necessidade de adopção da referida legislação especial não foi ainda satisfeita, mas é cada vez mais premente.
O próprio Tribunal de Contas, em vários relatórios de auditoria, tem assinalado as disfunções decorrentes da ausência de uma regulamentação completa e coerente neste domínio, a começar pelas dúvidas sobre a aplicabilidade do EGP aos administradores das empresas públicas sob forma societária e a acabar em aspectos práticos e elementares atinentes, designadamente, ao estatuto remuneratório dos titulares de órgãos de gestão e administração nas empresas públicas.
É este vazio legislativo, que gera disfunções, disparidades e até alguns excessos na gestão das empresas públicas, que o Governo vem agora colmatar, no quadro de uma reforma mais abrangente, que inclui igualmente a revisão do próprio Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, e a adopção de uma resolução do Conselho de Ministros determinando a observância pelas empresas públicas de princípios de bom governo internacionalmente reconhecidos, designadamente as recomendações da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económicos (OCDE) e da Comissão Europeia.
Deste modo, dá-se concretização à vontade política consagrada no Programa do Governo e cumpre-se, também, o disposto no n.º 13 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 121/2005, de 1 de Agosto.
Pretende-se instituir um regime do gestor público integrado e adaptado às circunstâncias actuais, que abranja todas as empresas públicas do Estado, independentemente da respectiva forma jurídica, e que fixe sem ambiguidades o conceito de gestor público, defina o modo de exercício da gestão no sector empresarial do Estado e as directrizes a que a mesma deve obedecer e regule a designação, o desempenho e a cessação de funções pelos gestores públicos.
O presente decreto-lei assenta, além do mais, no reconhecimento pelo Governo da importância das empresas públicas e dos gestores públicos na satisfação das necessidades colectivas e na promoção do desenvolvimento económico e social do País, seja pelo efeito directo da sua actividade na economia, seja pelo exemplo que devem constituir para a generalidade do tecido empresarial.
Esta importância social e económica é, todavia, indissociável de padrões elevados de exigência, rigor, eficiência e transparência, os quais são também decorrência de uma ética de serviço público que não pode ser aqui afastada apenas pelo modo empresarial de organização da actividade e da prossecução de finalidades públicas ou, pelo menos, com interesse público.
E é por isso que, no presente decreto-lei, se por um lado se aproxima o regime do gestor público da figura do administrador de empresas privadas, tal como regulado na lei comercial, por outro lado se atribui relevo e desenvolvimento acrescidos ao regime de incompatibilidades, à avaliação de desempenho, à determinação das remunerações, à definição do regime de segurança social aplicável e à observância das regras de ética e das boas práticas decorrentes dos usos internacionais.
Lugar de destaque, neste quadro, merecem a adopção generalizada do contrato de gestão envolvendo metas quantificadas – já previsto no Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, mas infelizmente com pouca ou nenhuma aplicação prática – e a possibilidade de afastamento do gestor público quando os objectivos fixados não forem alcançados sem que, com tal atitude, se gere prejuízo para o Estado.
Este decreto-lei estabelece também um processo de fixação das remunerações dos gestores públicos e de outros benefícios, tomando como base a distinção entre gestores executivos e não executivos e fazendo depender a remuneração variável, aplicável apenas aos gestores com funções executivas, da efectiva obtenção dos objectivos predeterminados, do mesmo passo que se limita a cumulação de funções e remunerações.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
CAPÍTULO I
Âmbito
Artigo 1.º
Gestor público
Para os efeitos do presente decreto-lei, considera-se gestor público quem seja designado para órgão de gestão ou administração das empresas públicas abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro.
Artigo 2.º
Extensão
1 – Aos titulares de órgão de gestão de empresa participada pelo Estado, quando designados pelo Estado, são aplicáveis, com as necessárias adaptações, os artigos 10.º a 12.º, 15.º a 17.º, o n.º 1 do artigo 22.º e o artigo 23.º
2 – O presente decreto-lei é subsidiariamente aplicável aos titulares dos órgãos de gestão das empresas integrantes dos sectores empresariais regionais e locais, sem prejuízo das respectivas autonomias.
3 – O presente decreto-lei é ainda aplicável, com as devidas adaptações, aos membros de órgãos directivos de institutos públicos, nos casos expressamente determinados pelos respectivos diplomas orgânicos, bem como às autoridades reguladoras independentes, em tudo o que não seja prejudicado pela legislação aplicável a estas entidades.
Artigo 3.º
Exclusão
Não é considerado gestor público quem seja eleito para a mesa da assembleia geral, comissão de fiscalização ou outro órgão a que não caibam funções de gestão ou administração.
CAPÍTULO II
Exercício da gestão
Artigo 4.º
Orientações
Na gestão das empresas públicas são observadas as orientações fixadas nos termos do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, e as recomendações para a sua prossecução previstas no mesmo preceito, bem como outras orientações que sejam fixadas ao abrigo de lei especial.
Artigo 5.º
Deveres dos gestores
Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, são deveres dos gestores públicos e, em especial, dos que exerçam funções executivas:
a) Cumprir os objectivos da empresa definidos em assembleia geral ou, quando existam, em contratos de gestão;
b) Assegurar a concretização das orientações definidas nos termos da lei, designadamente as previstas no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, e no contrato de gestão, e a realização da estratégia da empresa;
c) Acompanhar, verificar e controlar a evolução das actividades e dos negócios da empresa em todas as suas componentes;
d) Avaliar e gerir os riscos inerentes à actividade da empresa;
e) Assegurar a suficiência, a veracidade e a fiabilidade das informações relativas à empresa bem como a sua confidencialidade;
f) Guardar sigilo profissional sobre os factos e documentos cujo conhecimento resulte do exercício das suas funções e não divulgar ou utilizar, seja qual for a finalidade, em proveito próprio ou alheio, directamente ou por interposta pessoa, o conhecimento que advenha de tais factos ou documentos;
g) Assegurar o tratamento equitativo dos accionistas.
Artigo 6.º
Avaliação do desempenho
1 – O desempenho das funções de gestão deve ser objecto de avaliação sistemática, tendo por parâmetros os objectivos fixados nas orientações previstas no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, ou decorrentes do contrato de gestão, bem como os critérios definidos em assembleia geral.
2 – Nas entidades públicas empresariais, a avaliação do desempenho compete ao membro do Governo responsável pela área das finanças e ao membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade.
3 – Nas restantes empresas, a avaliação do desempenho implica proposta do accionista único ou maioritário a formular em assembleia geral.
Artigo 7.º
Avaliação no âmbito da empresa
1 – Nos casos em que o modelo de gestão da empresa pública em causa compreenda gestores com funções executivas e não executivas, compete à comissão de avaliação, caso exista, apresentar anualmente um relatório circunstanciado de avaliação do grau e das condições de cumprimento, em cada exercício, das orientações previstas no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro.
2 – Em caso de existência de um conselho geral e de supervisão, os respectivos membros podem designar entre si uma comissão de avaliação, à qual se aplica, com as devidas adaptações, o regime previsto no número anterior.
Artigo 8.º
Sociedades participadas
Nas sociedades participadas pelo Estado, o administrador eleito sob proposta deste deve exercer as suas funções tendo em conta as orientações fixadas nos termos do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro.
Artigo 9.º
Poderes próprios da função administrativa
O exercício de poderes próprios da função administrativa, nos casos legalmente previstos, observa os princípios gerais de direito administrativo.
Artigo 10.º
Autonomia de gestão
Observado o disposto nas orientações fixadas ao abrigo da lei, designadamente as previstas no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, e no contrato de gestão, o conselho de administração goza de autonomia de gestão.
Artigo 11.º
Despesas confidenciais
Aos gestores públicos é vedada a realização de quaisquer despesas confidenciais ou não documentadas.
CAPÍTULO III
Designação
Artigo 12.º
Requisitos
Os gestores públicos são escolhidos de entre pessoas com comprovadas idoneidade, capacidade e experiência de gestão, bem como sentido de interesse público.
Artigo 13.º
Designação dos gestores
1 – Os gestores públicos são designados por nomeação ou por eleição.
2 – A nomeação é feita mediante resolução do Conselho de Ministros, sob proposta do membro do Governo responsável pela área das finanças e do membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade.
3 – Não pode ocorrer a nomeação ou proposta para eleição entre a convocação de eleições para a Assembleia da República ou a demissão do Governo e a investidura parlamentar do Governo recém-nomeado, salvo se se verificar a vacatura dos cargos em causa e a urgência da designação, caso em que as referidas nomeação ou proposta de que não tenha ainda resultado eleição dependem de confirmação pelo Governo recém-nomeado.
4 – A eleição é feita nos termos da lei comercial.
Artigo 14.º
Administradores cooptados
Nas empresas do sector empresarial do Estado sob forma societária é admitida a existência de administradores designados por cooptação, seguida de ratificação pela assembleia geral.
Artigo 15.º
Duração do mandato
1 – O mandato é exercido, em regra, pelo prazo de três anos, sendo os mandatos dos membros do mesmo órgão de administração coincidentes.
2 – A lei e os estatutos fixam, até ao limite máximo de três, o número de renovações consecutivas dos mandatos na mesma empresa pública.
3 – Na falta de disposição legal ou estatutária, é aplicável o número de mandatos previsto no número anterior.
Artigo 16.º
Comissão de serviço
Para o exercício das funções de gestor podem ser designados, em regime de comissão de serviço, trabalhadores da própria empresa, da empresa mãe, ou de outras relativamente às quais aquela ou a sua empresa mãe exerçam directa ou indirectamente influência dominante nos termos do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro.
Artigo 17.º
Mobilidade
1 – Podem exercer funções de gestor público:
a) Funcionários, agentes e outros trabalhadores do Estado e de outras pessoas colectivas públicas, por tempo indeterminado, mediante acordo de cedência especial ou de cedência ocasional;
b) Trabalhadores de outras empresas, mediante acordo de cedência ocasional.
2 – À cedência especial e à cedência ocasional referidas na alínea a) do número anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto na Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho.
Artigo 18.º
Contratos de gestão
1 – Nas empresas que prestem serviços de interesse geral é obrigatória a celebração de um contrato de gestão, em que se definem:
a) As formas de concretização das orientações impostas nos termos do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, envolvendo, sempre que tal se mostre exequível, metas quantificadas;
b) Os parâmetros de eficiência da gestão;
c) Outros objectivos específicos;
d) Os elementos referidos no n.º 1 do artigo 30.º
2 – O contrato de gestão é celebrado no prazo de três meses contado a partir da data da designação do gestor público entre este, os titulares da função accionista e o membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade.
3 – O membro do Governo responsável pela área das finanças e o membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade podem determinar, por despacho conjunto, a celebração de contratos de gestão relativamente a empresas não incluídas no n.º 1.
4 – Nos casos em que se estipularem objectivos de gestão de exigência acrescida, o contrato de gestão pode ainda, excepcionalmente, mediante despacho fundamentado do membro do Governo responsável pela área das finanças e do membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade, estabelecer um regime específico de indemnização por cessação de funções.
CAPÍTULO IV
Exercício de funções
Artigo 19.º
Natureza das funções
Os gestores públicos podem ter funções executivas ou não executivas, de acordo com o modelo de gestão adoptado na empresa pública em causa, nos termos da lei e tendo ainda em conta as boas práticas reconhecidas internacionalmente.
Artigo 20.º
Gestores com funções executivas
1 – Para os efeitos do presente decreto-lei, consideram-se gestores com funções executivas os administradores designados nessa condição.
2 – O exercício de funções executivas tem lugar em regime de exclusividade, sem prejuízo do disposto no número seguinte e no n.º 4 do artigo 22.º
3 – São cumuláveis com o exercício de funções executivas:
a) As actividades exercidas por inerência;
b) A participação em conselhos consultivos, comissões de fiscalização ou outros organismos colegiais, quando previstos na lei ou quando tal resulte de decisão do Governo;
c) As actividades de docência em estabelecimentos de ensino superior público ou de interesse público, mediante autorização, por despacho conjunto, do membro do Governo responsável pela área das finanças e do membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade ou nos termos de contrato de gestão;
d) A actividade de criação artística e literária, bem como quaisquer outras de que resulte a percepção de remunerações provenientes de direitos de autor, sem prejuízo do disposto na alínea f) do artigo 5.º;
e) A realização de conferências, palestras, acções de formação de curta duração e outras actividades de idêntica natureza;
f) As actividades médicas dos membros executivos dos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde, independentemente da sua natureza jurídica, nos termos dos n.os 3 e 4 do artigo 20.º do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde.
4 – Sem prejuízo do disposto no n.º 6 do artigo 22.º, é ainda cumulável com o exercício de funções executivas o exercício de funções na empresa mãe ou em outras relativamente às quais a própria empresa ou a sua empresa mãe exerçam directa ou indirectamente influência dominante nos termos do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro.
Artigo 21.º
Gestores com funções não executivas
1 – Para os efeitos do presente decreto-lei, consideram-se gestores com funções não executivas os administradores designados nessa condição.
2 – Os gestores com funções não executivas exercem as suas funções com independência, oferecendo garantias de juízo livre e incondicionado em face dos demais gestores, e não podem ter interesses negociais relacionados com a empresa, os seus principais clientes e fornecedores e outros accionistas que não o Estado.
3 – Os gestores com funções não executivas acompanham e avaliam continuamente a gestão da empresa pública em causa por parte dos demais gestores, com vista a assegurar a prossecução dos objectivos estratégicos da empresa, a eficiência das suas actividades e a conciliação dos interesses dos accionistas com o interesse geral.
4 – Aos gestores com funções não executivas são facultados todos os elementos necessários ao exercício das suas funções, designadamente nos aspectos técnicos e financeiros, bem como uma permanente actualização da situação da empresa em todos os planos relevantes para a realização do seu objecto.
Artigo 22.º
Incompatibilidades e impedimentos
1 – É incompatível com a função de gestor público o exercício de cargos de direcção da administração directa e indirecta do Estado, ou das autoridades reguladoras independentes, sem prejuízo do exercício de funções em regime de inerência.
2 – Os gestores públicos com funções não executivas não podem exercer quaisquer outras actividades temporárias ou permanentes na mesma empresa.
3 – Os gestores públicos com funções não executivas e os membros das mesas de assembleias gerais não podem exercer quaisquer outras actividades temporárias ou permanentes em empresas privadas concorrentes no mesmo sector.
4 – A designação de gestores públicos do sector empresarial do Estado com funções não executivas para outras empresas que integrem o sector público empresarial deve ser especialmente fundamentada, atendendo à respectiva necessidade ou conveniência, carecendo ainda de autorização do membro do Governo responsável pela área das finanças e do membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade da empresa em que se encontre a desempenhar funções, se, neste caso, aquela designação ocorrer no âmbito dos sectores empresariais regionais e locais.
5 – O disposto no número anterior não se aplica no caso de designação de gestores públicos do sector empresarial do Estado com funções não executivas nas empresas referidas no n.º 4 do artigo 20.º
6 – Os gestores públicos não podem celebrar, durante o exercício dos respectivos mandatos, quaisquer contratos de trabalho ou de prestação de serviços com as empresas mencionadas nos n.os 2, 3 e 4 que devam vigorar após a cessação das suas funções, salvo mediante autorização expressa do membro do Governo responsável pela área das finanças e do membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade.
7 – O gestor deve declarar-se impedido de tomar parte em deliberações quando nelas tenha interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa ou ainda quando tal suceda em relação ao seu cônjuge, parente ou afim em linha recta ou até ao 2.º grau em linha colateral ou em relação com pessoa com quem viva em economia comum.
8 – Aos gestores públicos é ainda aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 8.º, 9.º, 9.º-A, 11.º, 12.º e 14.º e no n.º 4 do artigo 13.º da Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto.
9 – Sem prejuízo do disposto no artigo 11.º da Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto, antes do início de funções, o gestor público indica, por escrito, à Inspecção-Geral de Finanças todas as participações e interesses patrimoniais que detenha, directa ou indirectamente, na empresa na qual irá exercer funções ou em qualquer outra.
CAPÍTULO V
Responsabilidade e cessação de funções
Artigo 23.º
Responsabilidade
Os gestores públicos são penal, civil e financeiramente responsáveis pelos actos e omissões praticados durante a sua gestão, nos termos da lei.
Artigo 24.º
Dissolução
1 – O conselho de administração, a comissão executiva ou o conselho de administração executivo podem ser dissolvidos em caso de:
a) Grave violação, por acção ou omissão, da lei ou dos estatutos da empresa;
b) Não observância, nos orçamentos de exploração e investimento, dos objectivos fixados pelo accionista de controlo ou pela tutela;
c) Desvio substancial entre os orçamentos e a respectiva execução;
d) Grave deterioração dos resultados do exercício ou da situação patrimonial, quando não provocada por razões alheias ao exercício das funções pelos gestores.
2 – A dissolução compete aos órgãos de eleição ou de nomeação dos gestores, requer audiência prévia, pelo menos, do presidente do órgão e é devidamente fundamentada.
3 – A dissolução implica a cessação do mandato de todos os membros do órgão dissolvido, não havendo lugar a qualquer subvenção ou compensação pela cessação de funções.
Artigo 25.º
Demissão
1 – O gestor público pode ser demitido quando lhe seja individualmente imputável uma das seguintes situações:
a) A avaliação de desempenho seja negativa, designadamente por incumprimento dos objectivos referidos nas orientações fixadas ao abrigo do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, ou no contrato de gestão, desde que tal possibilidade esteja contemplada nesse contrato;
b) A violação grave, por acção ou por omissão, da lei ou dos estatutos da empresa;
c) A violação das regras sobre incompatibilidades e impedimentos;
d) A violação do dever de sigilo profissional.
2 – A demissão compete ao órgão de eleição ou nomeação, requer audiência prévia do gestor e é devidamente fundamentada.
3 – A demissão implica a cessação do mandato, não havendo lugar a qualquer subvenção ou compensação pela cessação de funções.
Artigo 26.º
Dissolução e demissão por mera conveniência
1 – O conselho de administração, a comissão executiva, o conselho de administração executivo ou o conselho geral e de supervisão podem ser livremente dissolvidos, ou o gestor público livremente demitido, conforme os casos, independentemente dos fundamentos constantes dos artigos anteriores.
2 – A cessação de funções nos termos do número anterior pode ter lugar a qualquer tempo e compete ao órgão de eleição ou nomeação.
3 – Nos casos previstos no presente artigo, o gestor público tem direito a uma indemnização correspondente ao vencimento de base que auferiria até ao final do respectivo mandato, com o limite de um ano.
4 – Nos casos de regresso ao exercício de funções ou de aceitação, no prazo a que se refere o número anterior, de função ou cargo no âmbito do sector público administrativo ou empresarial, ou no caso de regresso às funções anteriormente desempenhadas pelos gestores nomeados em regime de comissão de serviço ou de cedência especial ou ocasional, a indemnização eventualmente devida é reduzida ao montante da diferença entre o vencimento como gestor e o vencimento do lugar de origem à data da cessação de funções de gestor, ou o novo vencimento, devendo ser devolvida a parte da indemnização que eventualmente haja sido paga.
Artigo 27.º
Renúncia
1 – O gestor público pode renunciar ao cargo, nos termos da lei comercial.
2 – A renúncia não carece de aceitação, mas deve ser comunicada aos órgãos de eleição ou de nomeação.
CAPÍTULO VI
Remunerações e pensões
Artigo 28.º
Remuneração fixa e variável
1 – A remuneração dos gestores públicos integra uma componente fixa e pode integrar, no caso dos gestores com funções executivas, uma componente variável.
2 – A remuneração é fixada por deliberação em assembleia geral, no caso das sociedades anónimas, ou por despacho conjunto do membro do Governo responsável pela área das finanças e do membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade, no caso das entidades públicas empresariais.
3 – A fixação da remuneração é sempre fundamentada e obedece aos critérios estabelecidos no n.º 7.
4 – A competência para a fixação da remuneração pode ainda ser atribuída a uma comissão de fixação de remunerações designada pela assembleia geral, pelo conselho geral e de supervisão, ou através de despacho conjunto, nos termos do n.º 2.
5 – A comissão referida no número anterior pode coincidir com a comissão de avaliação da empresa, quando exista.
6 – Com vista a assegurar a harmonia de critérios no exercício das competências previstas neste artigo relativamente a empresas públicas do mesmo sector de actividade, podem ser constituídas comissões de fixação de remunerações para o mesmo sector de actividade através de despacho conjunto do membro do Governo responsável pela área das finanças e do membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade.
7 – As componentes fixa e variável da remuneração dos gestores públicos são determinadas, em concreto, em função da complexidade, exigência e responsabilidade inerentes às respectivas funções e atendendo às práticas normais de mercado no respectivo sector de actividade, sem prejuízo das orientações previstas no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro.
8 – A componente variável corresponde a um prémio estabelecido, nos termos dos números anteriores, atendendo especialmente ao desempenho de cada gestor público e dependendo a sua atribuição, nos termos do artigo 6.º, da efectiva concretização de objectivos previamente determinados.
9 – Nos casos previstos no artigo 16.º e na alínea a) do n.º 1 do artigo 17.º, e quando ocorrer autorização expressa do membro do Governo responsável pela área das finanças, os gestores podem optar pela remuneração do lugar de origem, mantendo as regalias ou benefícios remuneratórios que aí detinham.
Artigo 29.º
Remuneração dos administradores não executivos
1 – Os administradores não executivos têm direito a uma remuneração fixa, correspondente à actividade normal que desempenhem, até ao limite de um terço da remuneração de igual natureza estabelecida para os administradores executivos.
2 – Quando os administradores não executivos tenham efectiva participação em comissões criadas especificamente para acompanhamento da actividade da empresa têm ainda direito a uma remuneração complementar, caso em que o limite da remuneração global é de metade da remuneração fixa estabelecida para os administradores executivos.
3 – A remuneração dos administradores não executivos não pode integrar qualquer componente variável.
Artigo 30.º
Remunerações decorrentes de contratos de gestão
1 – Os contratos de gestão a celebrar com gestores públicos que exerçam funções executivas, previstos no artigo 18.º, contemplam, além das matérias aí indicadas, os seguintes pontos, nos termos do presente decreto-lei:
a) Valores fixados para cada uma das componentes remuneratórias consideradas, incluindo, designadamente, a parte variável da remuneração, a qual pode integrar, sem prejuízo do limite fixado nos respectivos estatutos, prémios de gestão passíveis de atribuição no final do exercício ou do mandato, de acordo com o cumprimento dos critérios objectivos dos quais dependa a sua eventual atribuição;
b) Outras regalias ou benefícios com carácter ou finalidade social ou inseridas no quadro geral das regalias aplicáveis aos demais colaboradores da empresa.
2 – A graduação da componente variável de remuneração tem por base indicadores de gestão, que resultem do desenvolvimento estratégico preconizado para cada empresa, no âmbito do sector em que se insere.
3 – Os indicadores referidos no número anterior são definidos em cada contrato de gestão com base nas orientações estabelecidas ao abrigo do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, e tendo em consideração as situações específicas em causa, designadamente as resultantes da prestação de serviços de interesse geral.
Artigo 31.º
Remunerações em caso de acumulação
1 – A acumulação de funções prevista no n.º 4 do artigo 20.º não confere direito a qualquer remuneração adicional.
2 – Nos casos de acumulação nos termos do n.º 4 do artigo 22.º, a remuneração acumulada dos administradores não executivos não pode exceder dois terços da remuneração fixa estabelecida para os administradores executivos com a remuneração mais elevada.
3 – No caso previsto no n.º 1, a remuneração que eventualmente caberia ao gestor reverte a favor da empresa em que o mesmo exerce ou passa a exercer funções.
Artigo 32.º
Utilização de cartões de crédito e telefones móveis
1 – A utilização de cartões de crédito por gestores públicos tem exclusivamente por objecto despesas ao serviço da empresa, sendo os documentos comprovativos de despesa entregues à empresa e arquivados, sob pena de reposição dos montantes não justificados.
2 – A utilização de telefones móveis por parte dos gestores está sujeita a limites máximos fixados pelo conselho de administração.
Artigo 33.º
Utilização de viaturas
1 – O valor máximo das viaturas de serviço afectas aos gestores públicos é fixado por deliberação em assembleia geral, no caso das sociedades anónimas, ou por despacho conjunto do membro do Governo responsável pela área das finanças e do membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade, no caso das entidades públicas empresariais.
2 – O valor previsto no número anterior é fixado à luz das orientações que venham a ser estabelecidas para o efeito, ou pelos accionistas ou pelo membro do Governo responsável pela área das finanças e pelo membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade, consoante o caso.
3 – O valor máximo de combustível afecto às viaturas de serviço é fixado pelo conselho de administração.
4 – É vedado o exercício de qualquer opção por parte dos gestores para aquisição de viaturas de serviço que lhes tenham sido afectas pela respectiva empresa pública.
5 – O disposto no presente artigo exerce-se em conformidade com as demais normas legais e regulamentares relativas à utilização de viaturas.
Artigo 34.º
Benefícios sociais
1 – Os gestores públicos gozam dos benefícios sociais conferidos aos trabalhadores da empresa em que exerçam funções, nos termos que venham a ser concretizados pelas respectivas comissões de fixação de remunerações, pela assembleia geral ou pelas respectivas tutelas, consoante o caso, com excepção dos respeitantes a planos complementares de reforma, aposentação, sobrevivência ou invalidez.
2 – Quando exerçam funções através de acordo de cedência especial, os gestores públicos podem optar pelos benefícios sociais do lugar de origem.
Artigo 35.º
Pensões
Os gestores públicos beneficiam do regime geral de previdência de que gozavam à data da respectiva designação ou, na sua ausência, do regime geral da segurança social.
CAPÍTULO VII
Governo empresarial e transparência
Artigo 36.º
Ética
Os gestores públicos estão sujeitos às normas de ética aceites no sector de actividade em que se situem as respectivas empresas.
Artigo 37.º
Boas práticas
1 – Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, os gestores públicos estão igualmente sujeitos às boas práticas decorrentes dos usos internacionais, designadamente em matéria de transparência, respeito pela concorrência e pelos agentes do mercado e prestação de informação sobre a sua organização e as actividades envolvidas.
2 – O Conselho de Ministros pode fixar, mediante resolução, os princípios e regras a que se refere o artigo anterior que devem ser especialmente observados pelos gestores públicos no exercício das suas funções.
CAPÍTULO VIII
Disposições finais e transitórias
Artigo 38.º
Exercício de funções por beneficiário de complementos de reforma
Quem, tendo exercido funções de gestor público auferindo, por causa desse exercício, benefícios complementares de reforma, desempenhe funções em empresas ou outras entidades públicas tem o direito de optar entre uma terça parte da remuneração nesta empresa ou entidade e aqueles benefícios ou uma terça parte dos mesmos e aquela remuneração.
Artigo 39.º
Aplicação imediata
1 – O disposto no presente decreto-lei aplica-se aos mandatos em curso.
2 – Os gestores públicos que, até à entrada em vigor do presente decreto-lei, preencham os requisitos dos planos complementares de reforma, aposentação, invalidez ou sobrevivência por este suprimidos, beneficiam, na aplicação das regras de cálculo da respectiva pensão, apenas do tempo de exercício efectivo de funções verificado à data da sua entrada em vigor.
3 – As prestações complementares de reforma e aposentação apenas podem ser auferidas após a cessação de funções como gestores públicos e a partir do momento em que estejam cumpridos os requisitos gerais de acesso à aposentação ou reforma e esta tenha lugar.
4 – Os gestores públicos relativamente aos quais se verifiquem situações de incompatibilidade ou acumulação de funções em desconformidade com o disposto no presente decreto-lei devem pôr termo a essas situações no prazo máximo de um ano ou fazer cessar os respectivos mandatos.
5 – A cessação de mandato prevista no número anterior não confere direito a qualquer indemnização ou subvenção.
Artigo 40.º
Direito subsidiário
Em tudo quanto não esteja disposto no presente decreto-lei, aplica-se o Código das Sociedades Comerciais, salvo quanto aos institutos públicos de regime especial.
Artigo 41.º
Revisão e adaptação de estatutos
1 – Os estatutos de empresas públicas que contrariem o disposto no presente decreto-lei devem ser revistos e adaptados em conformidade com o mesmo, no prazo máximo de seis meses após o início de vigência do presente decreto-lei.
2 – O disposto no presente decreto-lei prevalece sobre os estatutos das entidades referidas no número anterior que, decorrido o prazo aí mencionado, não tenham sido revistos e adaptados, sem prejuízo do disposto em legislação sectorial especial.
Artigo 42.º
Norma revogatória
1 – São revogados:
a) O Decreto-Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro;
b) As alíneas a) e b) do artigo 3.º e os n.os 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto;
c) A Resolução do Conselho de Ministros n.º 29/89, de 26 de Agosto.
2 – Até à entrada em vigor do novo regime remuneratório dos dirigentes dos institutos públicos, mantém-se transitoriamente em vigor a Resolução do Conselho de Ministros n.º 29/89, de 26 de Agosto, em relação àqueles dirigentes aos quais seja subsidiariamente aplicável o estatuto do gestor público.
Artigo 43.º
Entrada em vigor
O presente decreto-lei entra em vigor no prazo de 60 dias após a sua publicação, com excepção do disposto no artigo 37.º, que entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 1 de Fevereiro de 2007. – José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa – Fernando Teixeira dos Santos.
Promulgado em 19 de Março de 2007.
Publique-se.
O Presidente da República, ANÍBAL CAVACO SILVA.
Referendado em 21 de Março de 2007.
O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.